sábado, 19 de julho de 2008

Sagarana - João Guimarães Rosa

"Agora, Francolim, vá-se embora, que eu já estou com preguiça de você."

"Só e sério. Sem desperdício, sem desnorteio, cumpridor de obrigação, aproveitava para encher, mais um trecho, a infinda linguiça da vida."

"Era assim uma cantiga sorumbática, desfeliz que nem saudade em coração de gente ruim... Mas linda, linda como alegria chorando, uma alegria judiada, que ficou triste de repente."

"E ele ficou entendiado e pegou a saudadear."

"Aí, foi o diabo. O Major Anacleto ficou peru de tanta raiva."

"Santana se encaramujou: está ausente deste mundo, no departamento dos problemistas."

"E graças aos encontros inesperados dos velhos amigos que eu fico reconhecendo que o mundo é pequeno, e, como sala-de-espera, ótimo, facílimo de se aturar."

"Uma paixão da brava, iso é: da normal."

"Mais sofri, todavia, porque lua havia, uma lua onde cabiam todos os devaneios e em que podia beber qualquer imaginação."

"O arraial era o mais monótono possível (...) Um só latido, mágico, feito por muitos cachorros remotos. Grilos finfininhos e bezerros fonfonando. E pronto."

"(...) o que não recusei, porque: dinheiro, carinho e reza, nunca se despreza."

"Pior... pior... começamos a olhar o medo... o medo grande... e a pressa... O medo é uma pressa que vem de todos os lados, uma pressa sem caminho..."

"Mas aquilo era penoso... fazia medo, tristeza e vergonha, uma vergonha que ele não sabia bem por quê, mas que dava uma vontade na gente de querer pensar em outras coisas."

"Eu acho que nós, bois, - Dançador diz, com baba - assim como os cachorros, as pedras, as árvores, somos pessoas soltas, com beiradas, começo e fim: o homem não: o homem pode se ajuntar com as coisas, se encostar nelas, crescer, mudar de forma e jeito..."

"O homem tem partes mágicas... São as mãos... Eu sei."

"Foi num relance tão ligeiro, que só depois eu vi que tinha visto."

"Sorte nunca é de um só, é de dois, é de todos... Sorte nasce cada manhã, e já está velha ao meio-dia."

"Quando chega o dia da casa cair - que, com ou sem terremotos, é um dia de chegada infalível- o dono pode estar: de dentro, ou de fora. É melhor de fora."

"Mas Nhô Augusto era couro por curtir, e para quem não sai, em tempo, da linha, até apito de trem é mau agouro."

"(...) é uma raça de homem capaz de guardar o passado em casa, em lugar fresco perto do pote, e ir buscar na rua outras raivas pequenas, tudo para ajuntar à massa-mãe do ódio grande, até chegar o dia de tirar vingança."

"Até que pôde chorar, e chorou muito, um choro solto, sem vergonha nenhuma, de menino ao abandono. E, sem saber e sem poder, chamou alto soluçando:
-Mãe, mãe..."

"E ele teve uma vontade virgem, uma precisão de contar a sua desgraça, de repassar as misérias de sua vida. Mas mordeu a fala e não desabafou. Também não rezou (...) Deu-se ao descanso. Dormiu."

"E você ainda pode ter muito pedaço bom de alegria... cada um tem a sua hora e a sua vez: você há de ter a sua."

"E a casa matraqueou que nem panela de assar pipoca, escurecida à fumaça dos tiros, com os cabras saltando e miando de maracajás, e Nhô Augusto gritando qual um demônio preso e pulando como dez demônios soltos."

"Ô gostosura de fim-de-mundo!"